Anime e Filosofia #01 — Megalobox e existencialismo: A busca pela liberdade
Inspirado pelo canal Wisecrack ( Recomendo pra todos que conseguirem compreender bem inglês, inclusive), decidi escrever sobre dois tópicos que gosto bastante e me considero, em algum nível, versado. Anime e filosofia, e escolhi como primeiro, meu anime favorito de 2018, Megalobox, e uma das minhas correntes filosóficas preferidas, o existencialismo.
OBS: Spoilers estão a todo vapor, se não assistiu Megalobox (corre lá, são só 12 episódios), não recomendo que leia o artigo.
Megalobox não é somente, como alguns pensam, um anime de boxe, é uma história sobre liberdade, e como falar de liberdade na filosofia sem citar o mais importante filósofo do existencialismo, Jean-Paul Sartre. Para Sartre, o homem está condenado a ser livre, e toda sua existência vem dessa condição, uma vez que é impossível não ter escolha, pois mesmo a não-escolha, é uma decisão.
Mas o pensamento de Sartre e sua relação com Megalobox vai além de sermos prisioneiros de nossas próprias decisões, ele começa do ponto inicial do existencialismo, a frase célebre: “A existência precede a essência”, que em sentido amplo, nada é predeterminado, nossa essência, nosso propósito, é criado por nós mesmos, e não por condições externas. Com essa frase em mente, vamos ao que interessa.
A liberdade em Megalobox é expressada em sua forma plena, através do protagonista, Joe. Ele é o único sem um passado, mesmo sendo o protagonista, e isso é proposital, pois Joe não é um personagem completo e desenvolvido, sim um conceito, ele não tem traços marcantes de personalidade, ou grandes diferenciais, ele existe apenas para representar a liberdade em sua mais pura forma: enfrentar as consequências de suas decisões. Para Joe, ser livre é escolher e lidar com a escolha, coisa que ele era incapaz no começo do anime, seu único propósito é lutar com um rival digno, nada mais.
Yuri, por outro lado, é semelhante à Joe, mas é visto como um lado oposto, por estar numa posição de poder e de fama, coisa que Joe não possui. Mas mesmo assim, ambos desejam a mesma coisa, um rival à altura, Yuri durante todo o anime é um soldado da Shirato, feito apenas para mostrar a força e eficiência do Gear da empresa, e ele mesmo sabe disso, ele vive apenas para servir à sua mestra, Yukiko Shirato.
O ponto da virada para ele é quando Joe chega às finais do Megalonia sem usar Gear, e Yuri se sente impelido a lutar com ele nos mesmos termos, e faz a única decisão própria de toda sua história, decide retirar o Gear para lutar com Joe de igual pra igual, desafiando toda a vontade de sua mestra, e tomando para si mesmo, as rédeas de sua vida.
Vida autêntica x Inautêntica: Joe vs Yuri
Para Heidegger, viver autenticamente é tomar as rédeas de sua própria vida, assumir completamente a si mesmo,e lidar com a angústia da escolha. Viver não autenticamente é delegar essas escolhas para a sociedade, ou para outrem, deixar de ser a si mesmo, para ser o que lhe fizerem, ou como Sartre chama, agir de má-fé.
Joe inicialmente vive uma vida inautêntica, sendo controlado por Nanbu, mas se rebela e toma para si o controle, e vivendo a liberdade, usufruindo de suas escolhas, e lidando com as consequências. Já Yuri, passa a maior parte do anime vivendo uma vida inautêntica, sendo controlado pela Shirato, agindo de má-fé, e delegando suas escolhas para a empresa, e para sua mestra. Somente no final, Yuri atinge a realização da vida autêntica, rebelando-se contra a Shirato, e agindo sob sua própria vontade, e seus desejos.
Finalizando todo o papo existencialista, Megalobox usa os dois personagens principais como plano de fundo para passar uma mensagem sobre liberdade. E explora o conflito de Joe vs Yuri como dois lados opostos, que na verdade representam aspectos do existencialismo, a vida autêntica e inautêntica, de Heidegger, e o desejo por ser dono do próprio destino, a ideia principal da corrente.
Recomendo Megalobox para todos, assim como a leitura sobre o existencialismo, que pode ser bastante enriquecedora. Agradeço pela paciência de ter lido até aqui, e espero que tenham gostado.
Um abraço!